sábado, 8 de outubro de 2011

Um novo tipo de violência

LUCERA
Ivan, meu marido, diz que me encontrou em um descampado da província de Córdoba. Eu não tinha nem um ano de idade. Que metros adiante encontraram destroçados os restos de uma charrete de corrida, o corpo de um cavalo e dois corpos humanos que corresponderiam aos meus pais. Tudo dava a entender que o cavalo se lançou ao vazio enlouquecido e meus pais, pra minha sorte, puderam me empurrar para fora do carro antes da queda.
Ivan disse que há umas três décadas atrás proliferou um vírus da serra cordobesa que atacava os cavalos, especialmente os de corrida. Fazia com que eles se lançassem ao abismo.



                                                                                           Foto: JohnBanbury

Quando comecei a escrever esta obra, há alguns anos, o fiz a partir de uma estranha notícia que me chegou (assim o intuo) distorcida: suicídios coletivos de mamíferos quadrúpedes (nunca soube que classe de animais eram estes). O informe dizia que se atiravam de um precipício, aparentemente sem causa. Aconteceu no interior da Argentina. Senti que devia escrever sobre essa necessidade de estar no ar, de viver no ar, quando a terra já não pode suportar o peso do nosso pensamento. Estando no ar, ao quê nos atrevemos? Há um novo tipo de violência no ar. Eu o vejo. Eu o sinto dentro de mim e dentro de muita gente. Então decidi escrever. O trabalho em cena é terreno de reconhecimento e dissecação desses sentimentos censurados e amorais que não nos permitimos expressar de modo algum. Algo do trabalho final me permite dizer por que algumas coisas são como são.                                                          

Daniel Veronese

                                                                         publicação de Ivan Sugahara

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